segunda-feira, 15 de junho de 2015

Uma overdose de vinil

A minha droga é a música e a coca pura chama-se vinil.

Os meus amigos têm-se queixado que nas últimas semanas não tenho saído à rua. E com razão. Desde que redescobri todos os meus álbuns preferidos nos discos de vinil, não tenho cabeça para outra coisa. Ao pé da minha colecção de discos, sinto-me como a Amy Winehouse numa rave na casa de um traficante de cocaína colombiano. A minha droga é a música e a coca pura chama-se vinil.

Nas últimas semanas, a minha colecção de LPs cresceu ao ritmo de um incêndio de Verão no pinhal da Pampilhosa da Serra, queimando todo o espaço ocupado por CDs nas minhas prateleiras. Tenho muito orgulho na minha colecção, que só é rivalizada pela Fnac do Colombo (eles têm a Mono Box dos Beatles, eu (ainda) não) e por aquele maluquinho brasileiro que tem 3 milhões de discos no armazém. Construí-a com muito carinho, muito tempo perdido e claro, muito dinheiro torrado. Só na semana passada, vim de Marselha (onde fui ver o Macca) carregado com 48 discos do melhor loja de discos onde já entrei Tangerines Musiques.

Aquele na foto sou eu, armado em Tio Patinhas, a nadar numa piscina de vinis. O Patinhas tinha as moedas, eu é mais discos. Mas nem sempre foi assim.

Antes desta febre do vinil que me assolou nas últimas semanas, eu andava perdido, sem rumo, a resvalar para a ratoeira do MP3. Estava como o Fernando Couto, que dizia ter "caído nas malhas da nandrolona", como se tivesse tropeçado num lancil. Música em MP3 no telemóvel não é música, é nandrolona. E a nandrolona não bate como a coca (é o que me dizem). Não há prazer nenhum na nandrolona, só há a tentação do menor esforço. O MP3 é o whisky barato (malta, o Ballantine's de bom, só tem mesmo a música da publicidade), é o louro prensado vendido como haxixe na baixa de Lisboa, é fazer chichi na cama — bom e quentinho no início, irritante e nojento no fim. Uma merda.

O clique que me trouxe de volta à verdade foi "The Miracle". Não foi um milagre, foi o álbum dos Queen. O álbum não é sequer um dos meus preferidos, mas quando ouvi o baixo no "Breakthru"... Foi como se estivesse uma vida inteira a jogar Super Mario em 2D no Game Boy (para os mais novos, pensem numa Nintendo DS, mas a preto e branco e em formato calhau) e depois passasse para o Super Mario Galaxy na Wii, com gráficos em 3D e banda sonora orquestral. De repente, a música ganhou uma terceira dimensão. Tudo soava maior, mais vivo, mais encorpado. Digo isto sem snobismos de qualquer espécie. O vinil não é um snobismo, é um direito que nos assiste de ouvirmos música conforme era suposto que ouvíssemos. A diferença não se explica,ouve-se. Até porque, para vos descrever melhor esta sensação, sinto que teria que ir a uma prova de vinhos para ganhar vocabulário.

Desde este Breakthru (olha que belo trocadilho), gastei mais de metade do meu salário num gira-discos novo e o investimento não ficará por aqui. Neste momento, tenho no prato uma prensagem alemã de um álbum dos Floyd e é das coisas mais maravilhosas que já ouvi. Não quero sair daqui. Não compreendo sequer como é suposto eu ter uma vida lá fora. Os meus amigos queixam-se da minha ausência, mas quem tem sofrido a sério é a minha vizinha de baixo. Lara, se estás a ler isto, desculpa lá. Pensa assim: se eu gostasse de música House, era bem pior. Para ambos.

Originalmente publicado na NiT aqui, a 15/06/2015

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